MPA no RJ afirma a agroecologia e o abastecimento popular para a Soberania Alimentar do estado
Segundo encontro estadual do MPA no Rio de Janeiro aconteceu em Guapimirim entre os dias 10 e 11 de dezembro
“Ô campesinato vem cá, atender o chamado do MPA!” Foi com esse verso cantado que a coordenação do MPA no RJ recepcionou cerca de 150 pessoas de 25 municípios do estado do Rio de Janeiro. Agricultores e agricultoras chegaram ao encontro carregando mudas, sementes crioulas e um conjunto de história e memórias para partilhar com a companheirada.
A programação iniciou com uma roda de conversa que rememorou os passos dados pelo movimento em seu processo organizativo no estado. Escutamos muitas falas potentes sobre a importância da resistência camponesa e da aliança com a cidade para garantir a produção de alimentos saudáveis e o abastecimento popular nas cidades.
Um dos episódios que marcaram a chegada do MPA no Rio de Janeiro também foi rememorado, que foi a luta contra expulsão das famílias camponesas na instalação do Porto de Açu no norte fluminense. Cláudia Barreto, camponesa de Campos de Goytacazes, relatou o processo de assédio e de expulsão do campesinato que vivia na região onde o complexo ainda está em construção. Fato que demandou ao MPA acompanhamento a resistência camponesas na região.
“Nesse contexto, foram cerca de 1500 famílias expulsas de suas terras. Essa região era uma das grandes produtoras de tubérculos que abasteciam o RJ. Hoje, parte do local está um deserto, mas ainda tem nossas experiências de produção e comercialização que resistem no local.”
Ao longo da manhã, outros relatos sobre a vida, o trabalho e a luta na roça animaram a militância. “Onde me sinto melhor é na capina, na lida com o alimento. Na roçada e no meio da companheirada é onde eu carrego minhas baterias”. A frase faz parte de uma poesia criada por ela para exteriorizar o sentimento sobre o momento em que vivemos e a importância dos encontros.
A jovem Flora Rosa, que esteve em Magé no primeiro encontro do MPA no estado, em 2019, se emocionou ao falar sobre o apreço e os frutos gerados nestes momentos. “No último encontro, levamos conosco as sementes de milho. Distribuímos essa semente para outros camponeses da Fazenda Alpina, onde moramos. Um agricultor, que tinha parado de cultivar o milho, se interessou e pegou um punhado. Recentemente, ele reproduziu as sementes e distribuiu pra mais pessoas. Trocar sementes é fortalecer a soberania alimentar”, falou a camponesa de Teresópolis.
Beto Palmeira, da direção nacional do MPA, destacou que o trabalho com camponeses e camponesas no RJ tem ocorrido com a construção da aliança com o povo trabalhador da cidade que tem ocorrido a partir do diálogo sobre quatro pontos: problemas e soluções para a comercialização, a necessidade de unir a produção de alimentos com o trabalho com sementes, o fortalecimento da agricultura com os assentamentos e a importância do vínculo com a educação e com a universidade.
Conjuntura política do Brasil e o papel do MPA
Para análise da conjuntura, a programação contou com a participação de Saiane Santos e Sérgio Conti, da direção nacional do Movimento, que apresentaram os aspectos da situação política do Brasil e elementos para o fortalecimento do MPA em meio a esta conjuntura.
Para falar sobre os fatos que marcam a luta de classes no país, Saiane Santos abordou a importância de conhecer o passado e ter a memória dos fatos que desencadearam a nossa realidade. A partir disso, apontou algumas perspectivas que devem orientar a nossa luta nos próximos anos.
“Nosso principal desafio é garantir que no próximo governo tenhamos políticas públicas para o povo. O novo ciclo de governo progressista tem que impactar a organização social”, afirmou Saiane que ainda apresentou a importância da aliança com outros movimentos populares.
“Nossa esperança é acumular forças pra fortalecer o processo de mudança a partir do povo, com a força popular. Nós do MPA temos uma tarefa que é combater a fome. E o combate à fome só vai ser possível com o avanço da agroecologia e do alimento que o campeonato produz. Nossa missão é produzir comida de verdade que respeite as relações humanas e chegue na mesa do povo trabalhador”, destacou Saiane Santos.
Sérgio Conti, dirigente histórico do MPA, abordou a organicidade do Movimento a partir da necessidade das mudanças que precisamos realizar na sociedade capitalista. “O mais importante é ter quem se organize, quem lute para enfrentar o dragão da maldade e da fome”, abordou. Conti afirmou o desafio do MPA em dar respostas para o abastecimento a à produção alimentar.
“O MPA defende a vida. Por isso, nós lutamos pela terra, pela natureza e pela alimentação saudável. Cuidar da natureza é cuidar da nossa vida. Essa é o jeito que o MPA luta. Essa é nossa organicidade”, destacou Sérgio Conti.
Abastecimento popular a partir dos territórios
O segundo dia da programação iniciou com um debate sobre a importância de cuidar das sementes crioulas e de ampliar a produção e o abastecimento agroecológico através do fortalecimento de territórios de Poder Popular.
A metodologia da atividade consistiu na divisão de grupos por regiões, que tiveram a tarefa de refletir sobre desafios e possibilidades para os próximos anos, tais como a capacidade de organização e mobilização camponesa e a afirmação da agroecologia e do abastecimento popular de alimentos como caminhos centrais para a construção da soberania alimentar no estado do Rio de Janeiro.
Durante este momento, Bia Carvalho, do Coletivo Terra, apontou que somente durante a pandemia conseguiu, junto com o MPA, o Movimenta Caxias e a Coalização Negra por Direitos, organizar mais de 25 mil cestas de alimentos com aproximadamente 7kg, mas que agora precisam avançar com a produção e a comercialização. “Se a gente não mexer na vida econômica do território, ele acaba porque se a gente já tem a fragilidade das políticas públicas precisamos nos organizar e, a partir da produção e da autonomia financeira nós podemos avançar”.
Ao todo foram 9 regiões que apresentaram os desafios e compromissos para o próximo período. Após este momento, carta compromisso deste 2º Encontro Estadual foi lida, segue na íntegra:
Carta 2º Encontro Estadual do MPA RJ
Nós camponesas, camponeses, quilombolas, jovens, adolescentes, crianças, – trabalhadores/as do campo e da cidade – reunidos no lI Encontro Estadual do MPA do Rio de Janeiro, realizado nos dias 10 e 11 dezembro de 2022, no SINDFORTE, Guapimirim/RJ, nos comprometemos em:
Seguir produzindo alimentos, construindo estratégias de abastecimento e lutando pela soberania alimentar de nossos povos;
Dar continuidade à construção do MPA e sua expansão em todas as regiões do estado;
Defender a natureza e nossos territórios com sua diversidade natural e cultural: mantendo vivos nossos saberes, memória, crenças e resistência;
Empenho na construção de espaços de poder popular desenvolvendo neles a preservação e resgate das sementes crioulas, da produção de alimentos saudáveis conforme orienta nosso Plano Camponês;
Avançar na trabalho dos Coletivos de jovens, mulheres, MPA Mirim e educação camponesa, pensando ações voltadas a eles;
Consolidar a proposta de educação popular da nossa Escola Agroecológica Camponesa Ana Primavesi;
Fortalecer nossos trabalho junto aos Comitês Populares de Alimentos nas favelas e cozinhas solidárias;
Reivindicar políticas públicas para o campesinato, mas não abrir mão da nossa estratégia de auto sustentação econômica;
Manter a articulação com os demais movimentos camponeses do Brasil, bem como às organizações internacionalistas;
Dar continuidade e ampliar alianças com as organizações dos/as trabalhadores/as do campo e da cidade no estado do
RJ;
Dar sequência à luta pela construção do nosso país com soberania, democracia, direitos sociais, justiça e igualdade.
Nos comprometemos a ser multiplicadores dos princípios do MPA seguindo na luta por soberania alimentar e pela construção do Poder Popular!
Guapimirim, 10 de Dezembro de 2022
Viva o 2º Encontro Estadual do MPA RJ